Se fosse
necessário apontar uma pioneira na área da comédia, esta com certeza seria a
atriz de cinema mudo Mabel Normand. Um dos mais importantes ícones de seu
estúdio e de sua era, ela não apenas fez multidões rirem, mas também criou
diversas situações cômicas ao escrever e dirigir alguns filmes. Sem ela, também,
provavelmente Chaplin não teria chance no cinema e alguns dos momentos mais
preciosos da sétima arte nunca teriam sido criados. Em paralelo às comédias que
interpretava nas telas, Mabel enfrentava dramas em sua vida pessoal.
Nascida Amabel
Ethelreid Normand em Staten Island, perto de Nova York, sua data de nascimento
é controversa: parentes dizem ser 1892, enquanto as publicações de quando ela
estava no auge diziam 1894 ou 1895. Era a filha mais nova de várias gestações
malfadadas. Quatro filhos sobreviveram ao parto e apenas três chegaram à idade
adulta. Aos 14 anos Mabel deixou o colégio interno, longe de casa, para
trabalhar como modelo e ajudar financeiramente a família, tendo tempo apenas
para estudar desenho e música à noite. Seu pai era carpinteiro e músico
itinerante e Mabel queria ser uma grande musicista.
Em 1910 ela
conseguiu alguns trabalhos como extra em estúdios de cinema e logo evoluiu para
papéis maiores. Seus primeiros empregadores e colegas de cena ensinaram-lhe
muito, embora ela já tivesse aprendido várias expressões faciais, tão
essenciais no cinema mudo, durante sua experiência como modelo. Nesse tempo ela
atuou com igual sucesso em dramas e comédias, tornando-se logo ídolo das
plateias.
Sua
predisposição para a comédia falou mais forte e, quando foi para a Califórnia,
logo se juntou ao recém-fundado estúdio Keystone. Seus trabalhos lá eram
basicamente filmes curtos e que causavam riso fácil. Sua persona
cinematográfica se consolidou nesta época: Mabel, a personagem, era uma moça
espoleta que vivia as mais loucas situações, que exigiam que Mabel, a atriz,
fizesse cenas arriscadas sem dublê.
No final de
1913, Mabel era a mais importante estrela feminina do estúdio, mas seu chefe,
Mack Sennett, sofria com a perda de dois atores que foram tentar carreira solo.
Para substitui-los, ele foi até a Inglaterra e contratou um comediante do
teatro, chamado Charles Chaplin. Reza a lenda que Sennett detestou os primeiros
trabalhos de Chaplin para o estúdio e queria demiti-lo, mas Mabel insistiu para
que Charlie ficasse. Esta passagem é retratada no filme “Chaplin” (1992), em
que Mabel foi interpretada por Marisa Tomei. O ator permaneceu no estúdio,
Mabel tornou-se sua melhor amiga e ele foi ganhando prestígio e o melhor,
liberdade criativa.
Em meio a alguns
de seus maiores sucessos, como “Mickey” (1918), feito em sua própria produtora,
Mabel viu-se no meio dos maiores escândalos de sua época. Em 1921, seu antigo
colega de trabalho Roscoe “Fatty” Arbuckle foi acusado de estupro e assassinato
de uma jovem atriz em uma festa, gerando um debate inédito sobre a moral nos
filmes e a conduta dos atores. No ano seguinte, o diretor William DesmondTaylor, que estava lhe ensinando muito sobre artes, foi assassinado e Mabel foi
a última amiga a vê-lo com vida. Muitos questionaram o envolvimento dela com o
diretor e levantaram a hipótese de o culpado ter cometido o crime por ciúmes de
Mabel. Logo no início de 1924 seu motorista atirou em um magnata que havia
feito um comentário maldoso sobre ela. E, no mesmo ano, ela foi apontada como
pivô de uma separação, o que mais tarde foi comprovado ser uma acusação falsa.
Todos esses
problemas geraram consequências para Mabel, embora seu envolvimento fosse
mínimo. O destaque dado a ela pela imprensa acabou ajudando a divulgar alguns
de seus filmes que viraram sucesso de bilheteria, mas a cada nova confusão ela
se tornava mais triste e sua atuação tinha mais traços de sofrimento. O
fracasso de sua única peça, feita em 1925, também não ajudou.
Sua saúde
começou a declinar já em 1915, quando ela sofreu uma concussão mal explicada na
cabeça. Há quem diga que foi a amante de Mack Sennett, então noivo de Mabel,
que tenha atirado um objeto na cabeça da atriz. Depois de um tempo no hospital,
ela começou a tomar remédio para aliviar a dor, viciando-se no medicamento.
Algumas fontes citam que ela também seria viciada em cocaína e foi o desejo de
livrar-se do vício, e não o interesse por livros, que a fez se aproximar de
William Desmond Taylor. Assim como muitas estrelas da época, ela também não
levava uma vida regrada, alimentando-se de forma errada e participando de
festas selvagens que duravam a noite toda. Todos esses fatores, aliados a
fraturas ocorridas em suas cenas sem dublê, levaram-na a contrair pneumonia em
1923, tendo uma recaída quatro anos depois. A pneumonia evoluiu para uma
tubercolose que acabou por matá-la em 1930.
Mabel e Lew Cody |
Novamente há
muitos boatos sobre a vida amorosa de Mabel. Sua relação com Chaplin e o
magnata Samuel Goldwyn ainda é motivo de controvérsia. Sennett, seu ex-noivo,
jamais se casou. Estando em Paris em 1922, ela foi pedida em casamento por um
príncipe egípcio, mas recusou. Em 1926, casou-se com Lew Cody, com quem já
havia contracenado. Os dois tinham grandes diferenças e viviam separados, mas
Cody, assim como seus muitos amigos de Hollywood, foi de total importância para
Mabel em seus tempos difíceis. Cody faleceu em 1934, vítima de problemas
cardíacos. Sem viver para enfrentar as mudanças causadas pela chegada do som ao
cinema, Mabel Normand deixou um legado de comédias que ainda divertem e uma
história de vida que ainda emociona.
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