10 de ago. de 2012

E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que chamam de amor?

Quem acompanha o blog sabe que estamos na semana LGBTT do Antes que Ordinárias. Contudo, não foi explicado aos detalhes a motivação para nossa mobilização sobre o tema. Dia 11/08 irá fazer um ano que um garoto inteligente, engraçado e com um futuro brilhante cometeu suicídio: Richard. Vindo de uma família extremamente religiosa, o fato dele ter assumido sua sexualidade acabou desestruturando a falsa harmonia. O resultado foi o afastamento e não aceitação de seus pais, somados a um peso - que agravado com outros fatores - o levaram a uma morte injustificada e prematura. Ele era amigo de uma das colaboradoras daqui e nós achamos que seria uma forma bonita de lembrá-lo fazendo uma série de postagens sobre tolerância.

É estranho quando se percebe uma história como esta tão próxima, mas, quando foi distante? A intolerância e preconceito são traços da humanidade desde seus primórdios - seja por medo, seja por ignorância - sempre rondaram. Assim, finais como este não são tão incomuns; Veja a história do filme Orações para Bobby (disponibilizado por completo abaixo), o qual é baseado em acontecimentos reais.
Sinopse: Uma mãe religiosa após a descoberta de que seu filho Bobby é homossexual resolve levá-lo a terapia e cultos religiosos com a intenção de "curá-lo". Bobby não aguenta a pressão e acaba cometendo suicídio. Somente depois de encontrar o diário de seu filho é que ela percebe a situação sobre uma nova perspectiva e torna-se uma ativista a favor dos direitos dos homoafetivos.

Com tudo isto como fonte de inspiração, hoje no Assunto de Mulher resolvi falar sobre a descoberta do filho homossexual dentro do seio familiar e, com auxílio de pesquisa realizada, elencar algumas fases e posturas saudáveis para que a relação pais e filho não seja desgastada, mas sim, renovada.

Fase do Luto: A Descoberta
Mesmo que haja um diálogo e uma visão mais liberal dentro de uma família, o instante da confissão, da descoberta da homossexualidade de um filho é sempre um choque. Edith Modesto - filósofa, presidente da ONG Grupo de Pais de Homossexuais e mãe de um homossexual - compara tal a um luto: 
"Quando uma mulher está grávida ela pensa em diversas possibilidades. ‘Será que meu filho vai ser menina? Será que vai ser inteligente? Será que vai ter os olhos do pai?’ Porém, mãe nenhuma se pergunta: será que meu filho vai ser gay? Dessa forma é como se o filho esperado tivesse que morrer para que possamos aprender a amar o filho real."
Ou seja, cria-se uma idealização difícil de romper. A sociedade age considerando sempre a heterossexualidade como primária, fazendo com que  ninguém esteja preparado para ter filho gay. Quando se vê uma mulher grávida, ninguém pergunta se é menino, menina ou homossexual. Elabora-se toda uma possibilidade de vida que não acontecerá da forma imaginada. É normal o baque, contudo, o que se faz a partir dele passa a ser uma escolha.

Onde Errei?
Opção esta que não existe no quesito sexualidade, ao contrário do que a "crendice" popular incita. A orientação sexual é algo que nasce com a pessoa; Então, não há motivos para se questionar "no que foi que errei?". Não existe um erro de criação que transforma alguém em homossexual. Como também não existe uma "cura".  O psicólogo especialista em sexualidade Claudio Picazio elucida isto:
“A pessoa não escolhe. E não há explicação para o desejo erótico”. E aquela teoria de que o certo é o homem se atrair por uma mulher, por uma questão de reprodução, é uma besteira. “Nenhum homem olha uma gostosa na rua e diz: ‘quero ter um filho com ela’, certo?”
Por mais que procure respostas em vivências passadas, a orientação sexual não estará ligada a isto, quanto menos a estereótipos. Ampliar a visão e livrar-se de uma culpa inexistente é essencial para o caminho da aceitação.

Através da Perspectiva do Filho
Se para os pais é complicado, para o filho revelar sua homossexualidade é muito mais difícil. Os genitores devem tentar olhar a situação pela perspectiva de seu rebento; Notar que o ato de contar veio depois de muita luta interna, muitos enfrentamentos e confrontos com visões de mundo diversas. Claudio Picazio ressalta com maestria qual é o papel parental na situação:
“São os pais que devem consolar o filho. E não ao contrário. Eles precisam dar suporte a esse filho que está vivendo a angústia de descobrir que é homossexual. E não esperar que os filhos lhe amparem. Essa obrigação é dos pais”
Aos filhos cabem ser apenas eles mesmos. Aos pais, apoio e suporte são responsabilidades irrefutáveis.

Vencendo os Preconceitos
Um dos principais passos é a noção de que os preconceitos limitam a boa relação com o filho. Desta maneira, os antigos conceitos devem ser revistos e vivenciados sob uma nova luz. Não soa nada fácil, não é verdade? Entretanto, a busca por terapia, grupos de pais que convivem com seus filhos homossexuais e a constante vontade de ampliação de barreiras são vitais neste processo. Então, nada de sentir-se envergonhado por necessitar de ajuda neste trajeto pela aceitação.

Novos Sonhos: Alcançando a Aceitação
É muito improvável encontrar pais que não sonhem com o futuro dos filhos. Imaginam o casamento, a profissão, o sucesso... Até aí tudo bem, todavia, quando estes sonhos são impositores não possuem validade. Sejam eles quais forem. As aspirações dos pais para os filhos devem ser hipotéticas e mutáveis, já que os verdadeiros influenciados por sonhos são os que o vivem; Daí devem ser pessoais. Nem sempre o que se espera é o que trará felicidade. E não é esta a busca e o o desejo de qualquer pai para com seu filho? Perceber a alteração de sonhos apenas como um caminho diferente - e talvez melhor - para a felicidade é um grande passo até a aceitação. O filho não muda, continua sendo quem sempre foi, seus prospectos sim.  

Que tal um teste?
Leia o trecho abaixo e perceba como se sente em relação ao mesmo:
"E se realmente gostarem? Se o toque do outro de repente for bom? Bom, a palavra é essa. Se o outro for bom para você. Se te der vontade de viver. Se o cheiro do suor do outro também for bom. Se todos os cheiros do corpo do outro forem bons. O pé, no fim do dia. A boca, de manhã cedo. Bons, normais, comuns. Coisa de gente. Ninguém mais saberia deles se não enfiasse o nariz lá dentro, a língua lá dentro, bem dentro, no fundo das carnes, no meio dos cheiros. E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que chamam de amor? Quando você chega no mais íntimo. No tão íntimo, mas tão íntimo que de repente a palavra nojo não tem mais sentido. Você também tem cheiros. As pessoas têm cheiros, é natural "
- Caio Fernando de Abreu 

Responda honestamente: Imaginou tratar-se de uma relação amorosa exclusivamente homossexual? Se foi assim, o que isto lhe causou? Ficou incômodo? Se eu retirasse a imagem, pensaria que se tratava da paixão nascendo de um homem para com uma mulher? Faz alguma diferença? Todos nós sentimos amor, tesão, carinho, respeito. As pessoas vão muito além de seus gêneros e de sua orientação sexual. Perder a chance de conhecer seu filho por completo, pela pessoa extraordinária que ele realmente é, por conta de um detalhe está longe de ser uma boa postura. Então, caso a aceitação não esteja chegando para você, procure ajuda. Vai valer a pena!

Para maiores informações, não deixe de conferir a entrevista de Edith Modesto, a ONG Grupo de Pais de Homossexuais e  ao blog Mães pela Igualdade. Ainda, o site MdeMulher selecionou alguns bons livros para saber mais sobre o tema:

Ser homossexual não exige tratamento. 
Ser preconceituoso, sim.

12 comentários:

  1. Eu realmente imaginei que esta semana dedicada a causa LGBTT tivesse um motivo forte. Lamento por Richard e por todos os Richards que, mesmo não tendo cometido o suicídio, vivem mortos em vida por causa da rejeição de familiares, "amigos", "pessoas de Deus", entre outros.
    Este filme Prayers For Bobby foi um dos filmes mais marcantes de minha vida, foi como se me tirassem uma venda dos olhos, pois determinadas religiões (digo determinadas, visto que não posso generalizar por não ter presenciado absolutamente NADA semelhante na umbanda, onde o pai de santo que comandava o lugar que fui é um homossexual assumido e também tenho conhecimento das igrejas inclusivas cristãs contemporâneas, como a que mostra no próprio filme) tem um poder terrível de massacrar um ser humano, causar a morte de uma pessoa por causa de um trecho de um livro considerado sagrado e que em muitos casos, trechos que o próprio Novo Testamento invalidou.
    Eu detesto, SIMPLESMENTE DETESTO, a frase que estes crentes usam de: "Deus não ama o pecado, mas ama o pecador", em suas palavras sobre a "cura" da homossexualidade (cura de uma "doença" que nem CID tem e não me assustaria se daqui um tempo acabem criando um).
    Supondo que homossexualidade fosse realmente um pecado como pregam, se Deus é tão misericordioso quanto dizem, Deus amaria o pecados, apesar dos seus pecados.
    Lembro claramente quando escrevi um texto contra a homofobia e um seguidor foi em minha caixa de comentários ("religioso", obviamente), a Joicy deve até lembrar, visto que ela acompanhou o post e até respondeu, onde pessoa defendia o seu direito de ser homofóbico, pelas famílias ou algo parecido. Coisas toscas e ruins, minha mente costuma bloquear, mas foi mais ou menos isto. Eu acho lamentável. Lamentável também que este seja o tema central dos trolls quando querem atacar... Lamentável que as pessoas não consigam ver além do preconceito, não consigam enxergar o filho, o amigo, a pessoa incrível que poderiam trocar tantas experiências de vida por causa de uma babaquice nojenta.
    Nojentos são os homofóbicos.

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  2. Fiquei muito triste pelo Richard, infelizmente o descaso de muitos acaba por machucar demais a alma de quem já sofre por ser digamos diferente de padrões impostos por uma sociedade hipócrita.Como disse agora não sei se foi no outro post, ninguém precisa sair gritando por ai sua opção sexual, mas julgarem o carácter por isso é uma lastima.

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  3. Uma postagem de cabeça aberta que demonstra o que todos os pais deveriam fazer numa situação dessas: demonstrar seu amor incondicional pelos filhos e apoiá-los sempre.

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  4. Eu serei mais uma a dizer o 'sinto muito por Richard'. E pensar que enquanto estamos aqui parados, não sabemos da gravidade deste problema: a homofobia. É certo que precisamos fazer algo, mesmo que seja apenas nos expressar, talvez as nossas palavras conscientizem essa população arcaica que 'domina' o Brasil. Achei muito tocante a maneira como abordou o amor, seja ele entre homossexuais, heterossexuais, enfim. É certo que o seu texto é uma verdade, pois na maioria dos casos, é exatamente isso o que acontece. É um beco sem saída, para o filho, que as vezes só pensa no bem estar dos pais e acaba reprimindo os seus sentimentos. Pois, é por esta razão que muitos homossexuais não se assumem e preferem viver no anonimato, o que na minha humilde opinião, é agoniante. É difícil enfrentar a realidade, quando não se pode fazer nada para mudá-la. Não pode-se apenas falar 'não quero ser um homossexual, portanto não serei.' Infelizmente, não é assim, não há solução, não há fugas, nem nada disso. O que eles precisam é do apoio e amor materno e paterno. Se não, é complicado conseguir sozinho. Sobre o filme, já me falaram algumas vezes sobre o conteúdo do mesmo,porém ainda não tive tempo de assisti-lo. Confesso que fiquei curiosa, para ver a película. No mais, ótimo texto, ótimo assunto. Talvez em breve, eu também resolva opinar sobre ele.

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  5. Pooxa... é uma pena isso ter acontecido com o Richard... aki na minha cidade um professor universitário cometeu suicidio por ser gay não ter a aceitação da família. Graças a Deus, quando contei pra minha familia, apesar do choque, todos me tratam super bem e me respeitam mto. Até levei meu namorado pra conhecer minha avó e ela adorou ele... hehehe... infelizmente não é uma coisa normal nas familias, pois tenho amigos q ainda escondem sua condição de seus parentes por medo da repreenção. Ainda bem q temos voc~es, q lutam ao nosso lado por uma coisa que sinceramente, não é dificil de se fazer, mais muitos ainda persistem em ignorar.. SÓ QUEREMOS RESPEITO!!!

    http://mostraoseu.blogspot.com.br

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  6. Muito bem explorado o texto!
    Karlinha, tu já sabe o que penso sobre tudo isso o preconceito que ainda vivo em diversos setores...Enfim, essa semana está muito especial pra mim!
    OBRIGADA!
    bjs

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  7. Primeira vez visitando o seu blog e já me deparo com essa postagem super bem escrita e tolerante. Quem dera se a maioria das pessoas do mundo tivessem pelo menos essa tolerância e conhecimento que você tem, seria mais fácil mudar o mundo.
    Obrigado pela postagem que me alegrou o dia e encheu meus olhos de esperança.
    Não precisamos perder ninguém para reconhecer que cada pessoa no mundo tem o seu valor.

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  8. Maravilhoso o texto e a abordagem!
    Muitos pais precisam ler isso!

    Parabéns, Karla!

    Beijos.

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  9. Oi Karla!

    Excelente texto e obrigada por disponibilizares o filme para download.

    Lembro-me quando me assumi perante a minha mãe. Para ela não foi surpresa, ela sempre soube. Tive sorte, sou aceite e temos um relacionamento de cumplicidade.

    Lamento pelo Richard e por todos que não são aceites.

    Beijos,

    Cris Henriques

    http://oqueomeucoracaodiz.blogspot.com

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  10. sinceramente prefiro minha filha morta que lesbica nada contra gays mais na minha casa nao

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  11. Não fale isso. Se um dia sua filha morrer, você vai sentir a maior amargura da sua vida.

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  12. Comentários como o do Alexandre me levam a pensar no quanto as pessoas conseguem colocar sua ignorância acima de tudo... até mesmo acima de quem deveria ser a pessoa que mais amaria no mundo!

    Enfim... sobre o texto, karla, fico muito triste em ver pessoas sofrerem discriminação vinda daqueles que, espera-se, deveria protegê-las, os pais. Eu assisti Orações por Bobby duas vezes... é super reflexivo e mostra o que a culpa pode fazer com o coração de uma mãe.

    bjks

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